Trump ou Temer, eis a questão.

A globalização morreu, é isso mesmo? E ao perder a direita globalista, a esquerda euro-americana não tem meios de levar essa bandeira, apelando para um agora inexistente pragmatismo eleitoral que não se justifica mais. A elite ocidental está perplexa e sem saídas.

São tantos danos, tantas rachaduras, que não há recursos suficientes para tentar tapar cada buraco, estão simplesmente em pânico. Um dano, difícil de mensurar e subestimar, é o soft-power completamente destruído com a vitória de Trump. Ao demonizar completamente o candidato, tornou o governo americano completamente frágil, tanto internamente (protestos), quanto externamente (Trump, como governo americano, será odiado).

Isso pode ser vantajoso aos partidários democratas, mas é fatal para um país que está operando acima dos seus recursos para manter suas posições geopolíticas em plena expansão chinesa na Ásia e russa no Oriente Médio.

Analisando as reações ao governo Trump

O mais interessante é refletir sobre os cenários que podem reagir ao governo trump, há grandes tendências possíveis, já em curso:

A cooptação foi iniciada, com toda mídia mainstream fazendo auto-crítica e apelando ao pragmatismo do “homem de negócio” Trump. Todas as forças do estabilishment o bajula em nome da unidade, enquanto piscam para os protestos de rua contra ele. As primeiras declarações de Trump indicavam uma cooptação (inclusive, elogiando os clintons), mas declarações recentes, sobre a imigração, pressupõe um recuo do recuo.

Outro cenário será uma campanha midiática de revolta popular contra Trump, mas o mainstream está acompanhando que essa dinâmica está sendo liderada por parcelas mais radicais, e até abertamente socialistas, sob inspiração do Bernie Sander. É uma via que tem muitos riscos para o estabilishment, pois pode sair do controle em um país que depende todo o estabilishment global e cujos fatos reverberam por todo o mundo.

A última hipótese pode ser uma caminho do meio trilhado com a fricção das duas tendências anteriores. Nesse cenário, para manter o menor dano possível as posições geopolíticas americanas, o estabishment incorpora a agenda de Trump, consegue algumas poucas concessões cosméticas, mas, sobretudo, o blinda e o canoniza, para que possa restabelecer o soft-power (influência) perdido e compensar o encolhimento da presença militar (hard-power) defendido pela política isolacionista de Trump.

No resto do mundo, e aí?

Com Trump, ficará mais difícil a pregação americanófila a um governo que a grande mídia brasileira macaqueou como “terrível” e “catastrófico”. É o reflexo dessa inflexão nos vários governo-colônias pró-americanos que pressionarão pela acomodação ao Trump na imprensa oficial, ainda que isso provoque danos em outras colônias, como Ucrânia.

Aliás, a Ucrânia é o caso mais dramático. Se realmente Trump fizer um novo reset com a Rússia, o governo-cliente cairá, somada a sua baixa popularidade, e nesse novo arranjo, um governo seguinte pode ser pró-russo, sem ser necessariamente anti-americano, já que os laços russo-americanos estarão em seu melhor nível.

No Brasil, a era trumpista colapsou a coalizão de centro-direita (PSDB-PMDB) em favor da extrema-direita de Bolsonaro. O PSDB não terá meios senão recuar na sua doutrinação pró-conservadora, pois não pode competir nesse quesito com Bolsonaro, e qualquer recuo irá alienar mais a sua base ideologizada ou mesmo fortalecer o discurso das esquerdas. O histórico recente sugere que o PSDB preferirá apoiar um Bolsonaro, do que um Lula, em um eventual segundo turno, uma espécie de Crivela vs Freixo. Mas não impedirá seu colapso, independente de quem apoie ou não apoie.

É certo que teremos Alckmin (seja pelo PSDB ou PSB), Serra (seja pelo PSDB ou PMDB) e talvez o próprio Aécio (se conseguir usar a máquina a seu favor, outra vez). De qualquer forma, Alckmin e Serra estarão na campanha, dividindo a centro-direita; apesar de Serra controlar as mídias, Alckmin terá a máquina partidária (talvez a estadual e a nacional), e Doria provou que essa máquina é mais eficiente que as mídias, agora ainda mais fracas com o blowback de seu eleitorado conservador com Trump.

Na extrema-direita temos Bolsonaro, tudo indica um “inside job” para impedir sua candidatura (prisão), já que ela pode retirar votos de Serra. Mas mesmo sem Bolsonoro, nada sugere que esse voto vai para o PSDB, e não para qualquer outro candidato “trumpista” de plantão.

Seja qual for, o cenário indica uma direita confiante, portanto, dividida em diversos candidatos que querem surfar na “onda conservadora”. De fato, o melhor cenário seria o Lula não concorrer, ou porque foi preso, dessa forma sendo martirizado, ou porque preferiu não concorrer em favor de um novo nome, que poderia ser o Ciro Gomes, este é um nome muito controverso e politicamente ambíguo, e tem um passivo terrível de gafes, facilitando o trabalho das mídias serritas, porém, é o mais competente.

A não ser que um levante sandernista faça uma revolução socialista nos EUA contra Trump, o que não é totalmente impossível no momento, o cenário não é interessante para uma vitória de Lula.

Hoje vivemos o melhor momento para ser de esquerda e estar na oposição, que o PT não perca esse momento em nome de voltar para o poder a qualquer custo. Deixemos eles desconstruírem, colocarem o bode na sala, desmoralizarem o discurso anti-petista aos olhos dos anti-petistas, para que o retorno das esquerdas seja mais transformador e abrangente do que uma aliança com o PMDB permitia que fosse.

O retorno de Lula agora, sob uma crise econômica terrível, e completamente minoritário no congresso, com a população totalmente tendente ao conservadorismo, seria uma trágica armadilha, espero que ele e seu partido perceba isso, antes que seja tarde. E se não perceberem, espero que eu esteja miseravelmente errado.

 
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